sábado, 26 de junho de 2010

O estranho som

Iééééééééééééé .... grrr.

Não aguentava mais esse barulho todo dia. Toda vez que meu vizinho saía a noite começava esse estranho ... quase berro. O quadrado da janela piscava em tom azul, como se alguém estivesse levando um choque elétrico. Mas como? Não tinha ninguém em casa. Ele morava sozinho fazia anos e recentemente estava saindo com a vizinha da frente. Vou observar amanhã cedo se ela tem alguma reação diferente, talvez pânico. Será que não estou tendo idéias mas sem saber exatamente o que tem lá? Bom, ele é meio estranho. Aos poucos, em meus pensamentos me rendi ao sono.

Iééééééééééééé .... grrr. - nããããão acredito!! Levantei as 2h em um salto, todo assustado. Aquilo estava me deixando absolutamente fora de controle. Mas foi quando um carro estacionou em frente que finalmente o silêncio chegou. Meu vizinho, o José, conduziu Luíza para dentro de sua casa e no vestido via-se uma mancha vermelha. Mas foi quando ela entrou que aconteceu a cena que mais me intrigou: Iééééééééééééé ....Iééééééééééééé ....Iééééééééééééé .... e ela saiu correndo assustada. Ele foi atrás gritando: "Luíza, não precisa se assustar. Ele nunca fez mal a ninguém!" - Como assim: Ele?? - pensei.

Havia mais alguém naquela casa. Será que ele tem um filho deficiente? Alguém que tenha problema de raciocínio e locomoção? Ele seria tão louco de deixar essa pessoa sozinha, seria?? Talvez. Eu tinha que resolver isso. Amanhã irei entrar lá e depois chamo a polícia.

Cheguei mais cedo ao trabalho e pedi para sair por volta de 11h. Jorge não era só um grande chefe: era um grande amigo. Não sei porque sempre facilitava as coisas para mim. Às vezes passava a idéia de que era homossexual e através de agrados tentava me conquistar. Sempre acreditei que existem homens com trejeitos gays, mas é de sua natureza e não são exatamente gays. Nada contra eles, apenas não é minha opção.

Peguei minha moto, com aquele cuidado de quem está chegando na última prestação, para tentar chegar mais cedo que o José. Estava nervoso, afinal não sabia o que iria encontrar lá. E se houvesse alguém machucado ou na pior das hipóteses ele fosse um serial killer? Nossa, quanta imaginação.

Deixei a moto na minha garagem e saí discretamente em direção à casa do vizinho."Iééééééééééééé".... Nossa!! Que susto. O coração batendo a mil. Passei o jardim, rapidamente, tentando não ser visto e no silêncio máximo possível. De repente "Grrrrr ... Iééééééééééééé ...." Será que ele percebeu que tem alguém na sua casa? Dizem que algumas efermidades do cérebro, apesar da loucura, desenvolvem melhor determinados talentos, como uma percepção aguçada. Não podia desistir agora. Enfiei um grampo na fechadura, abaixei o trinco, e virei para os lados, para saber se havia alguém olhando. Nada! Ótimo!

Dei o primeiro passo para frente e: "Alto!!!" - disse uma voz firme. Senti um cano frio tocando minha cabeça. Será que era a técnica dele? Deixar alguém curioso, atraí-lo e depois dar o bote final. "Deite no chão" - ordenou. Não tive escolha. "Polícia" - continuou ele. Polícia??? Logo atrás, vi pés femininos se aproximando. Virei o olho e percebi que Luíza chegando. "É você??" - gritou ela com surpresa. "Você o conhece?" - disse o policial. "Sim, ele mora em frente" - respondeu ela.

Nesse momento chegou José, assustado logo dizendo: "O que está acontecendo?". Eu não perdi tempo, afinal era eu quem queria chamar a polícia. "Dr. estou aqui porque há mais de 3 meses tenho escutado vários gritos dentro dessa casa. A situação piora no período noturno e tenho medo que possa representar risco. Os policiais olharam com desconfiança para José e de repente "Iééééééééééééé ....grrrrrr". Luíza arregalou os olhos, assim como os policiais. Levantei sem resistência dos policiais, que empunharam a arma e seguiram em frente. José começou a rir. Os policiais saíram do quarto rindo também. José me convidou a entrar e conhecer sua "vítima". Depois de virar piada de todos, fui com determinação e quando vi um papagaio em sua gaiola com seu maldito "Iééééééééééééé ....", só não ri para ter o mínimo de moral.

José entendeu que não tive a intenção de assaltar sua casa e acabou deixando de registrar boletim de ocorrência. Luíza, que não tinha entrado ainda o beijou se desculpando pelo mal entendido assim como eu. Conversei com ele que me explicou que quando saía a noite seu papagaio devia sentir sua falta e por isso deixava a tv ligada. Era um animal de estimação da família dele que morava no interior e amanhã mesmo seu pai iria buscá-lo. A mancha vermelha que Luíza tinha naquela noite que saíram juntos pela primeira vez era ketchup, que acabou sujando seu vestido.

Começamos a partir disso uma boa amizade e 10 anos depois, ainda rimos muito da situação. Luíza acabou se unindo à ele e estão juntos.

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