quarta-feira, 30 de junho de 2010

Parecia um assalto. Ele levou uma expectativa, mas eu ganhei um prêmio.

Entrei no site do cinema do shopping e custei para escolher o filme, porque queria assistir a todos. Liguei para Rosália, que achou ótima a idéia e combinamos que iria buscá-la as 19h. Aquela calmaria no trânsito até a casa dela parecia diferente do inferno do dia a dia. Ela morava no centro, que normalmente era o terror de qualquer pessoa impaciente durante a semana, principalmente no horário do rush.


Estacionei meu Golf em frente ao seu prédio e apertei o 704. Aquela voz suave logo percebeu quem era e disse para aguardar um momento que já iria abrir para eu subir e buscá-la. Até insisti, dizendo que poderia aguardar embaixo, mas ela fazia questão que eu subisse.

De repente senti um mau cheiro, só tive certeza que o odor de suor e álcool estavam próximos quando percebi aquela figura humana ao meu lado. Tentei fazer de conta que não era comigo, mas era impossível deixar de ouví-lo. Imaginei aquelas histórias de sempre: "Sou de uma cidade do interior e estou juntando dinheiro para voltar. Pode me ajudar?". Ou "Ainda não comi hoje, teria um trocado para mim?" Disse que não tinha nada, como forma de me livrar do insistente mendigo, que parecia estar alocoolizado.

ZZiiiid Plakk fez o barulho que liberou o acesso, "Pode entrar" falou a voz no interfone. No mesmo instante que o portão abriu, com uma saúde totalmente diferente da que aparentava antes, o mendigo assumiu outra postura e entrou correndo. A muito custo consegui evitar que o portão se fechasse, impedindo minha entrada. Por muito azar, estavam saindo 2 senhoras do saguão principal, que dava acesso ao prédio e assim, se mostrando mais uma oportunidade para que o mendigo invadisse o prédio. Fui correndo atrás e ele usou sua vantagem para fechar e ganhar tempo. Liguei para Rosália, que logo abriu. Na tensão e a vontade de impedir que o mendigo, que agora já desconfiava ser um ladrão, com uma ótima estratégia para acessar o prédio, acabei esquecendo de avisá-la.

Enquanto corria para subir as escadas, que imaginei ser sua rota de escape, aproveitei para ligar para ela avisando do problema. O celular tocava, tocava, tocava ... ninguém atendia. Não conseguia ouvir nada. Nem passos subindo, nem voz, nem nada. Saí da porta do 2º andar respirando rapidamente, quase sem fôlego. Ouvi no andar seguinte, batidas na porta e gritos. Corri para cima, enquanto ligava de novo. Nada. Ninguém atendia. Haviam pessoas na porta, conversando assustadas entre si, mas nenhum mendigo. Conversei rapidamente com eles, 2 se dispuseram a ajudar a achá-lo enquanto as outras começaram a ligar para os outros apartamentos. Me chamou atenção, uma das portas, onde estava escrito: "Eu disse que voltaria. Te amo." Que estranho. Os moradores estavam ainda mais boqui-abertos. Teria sido aquele "mendigo"?

Entrei no elevador junto com outros moradores presentes e dispostos a pegar o tal mendigo, enquanto outros foram pela escada. Já não havia mais ninguém calmo lá. As notícias correram com uma velocidade tal, feito assunto quente no twitter. O pior, era saber que fui eu quem dei o início àquela situação toda. Estava me sentindo muito mal. Pelo celular, um morador que estava subindo pelas escadas avisava que não encontrou ninguém, assim como os outros. "Ele deve ter ido direto ao último andar" pensei. Mas ... o último era o 7º!!! Oo 7º!??! Será que Rosália está bem? Liguei novamente ao celular dela, mas ninguém atendia.

Tentei ligar de novo e agora finalmente Rosália atendeu. De forma atrapalhada, quase vomitando palavras lhe expliquei o problema. Ela disse que ficasse calmo, mas ela já estava a par da situação. "Como?" - perguntei. "Ele está aqui" - ela respondeu. Aquelas palavras me gelaram. Uma sensação ruim se apossou de mim. Eu lhe orientei para que ficasse calma que estava subindo, e pedi para não dar pistas do que eu estava fazendo.

Saímos todos daquele elevador, direto para o apartamento dela. Porta aberta. Ixx .. pensei. Entramos na sala, e logo foi possível sentir o cheiro do álcool. Vi roupas dele jogadas no chão. Nossa!! Pensei o pior. Fomos à sacada e ... os 2 se beijando??? Não entendi mais nada. Foi quando ela veio, cabisbaixa, dizendo: "Calma pessoal, está tudo bem." - "Tudo bem???" - pensei. Nesse momento surge o ... o ... peraí ... mas esse não é o mesmo que vi lá embaixo. Estava com uma camiseta de malha branca, de uma marca famosa, além da calça jeans. Brinco na orelha, dentes brancos como giz de cera e brilhantes feito vidro. Com certeza se fosse mendigo, não poderia ser ele. "Quero que você conheça o Carlinhos".

Foi com meu visível sentimento de perda, que ela foi nos explicando, que eles tinham terminado havia 6 meses, e ele tinha tentado falar com ela várias vezes. Tinha ligado, esperado ela sair do prédio para conversar com ela, mas ela sempre se esquivava. Como fazia parte de uma banda de pagode, fecharam alguns shows em outras cidades, e se ausentou durante 2 meses e não tinha jeito de conseguir contato com ela. Ele disse que a amava demais e quase tinham se casado. Faria de tudo para recuperá-la. Essa palavra doeu demais em mim, afinal ela também tinha me conquistado. Seria a nossa noite. Quando eu e Rosália nos aproximamos no curso de oratória, ela revelou que estava buscando um novo relacionamento, mas no fundo também não o esquecia. Por isso aceitou prontamente irmos juntos ao cinema. Enquanto isso ele planejou uma maneira para falar com ela. Esperou até alguém entrar no prédio. Primeiro achava que era no 3º andar, onde ela morava primeiro, depois lembrou de sua mudança ao sétimo.

Depois de tudo esclarecido, saímos todos, deixando-os a sós. A moça que estava tinha chegado a pouco, era filha de um dos moradores que subiu comigo e falou: "Você ainda aceita alguém para lhe acompanhar no filme?" Foi assim que conheci Sônia, a mulher mais incrível da minha vida.

2 comentários:

  1. Claus
    Seus trabalhos em prol da cultura, educação e história para nossa cidade é de um valor inestimável.
    Obrigado pelo comentário em meu blog.
    Precisamos sim fazer alguma coisa, para que esta coisa ridícula não se perpetue. Existe pessoas que já nasceram e morreram sem ver este prédio concluído ou resolvido.
    Abraços e sucesso.
    Adalberto Day cientista social e pesquisador da história

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  2. Escreves bem, gostei do seu estilo urbano se encaixa muito com o meu, de uma outra perspecitiva eh claro...

    bju

    http://www.pequenosdeleites.blogspot.com

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